segunda-feira, 31 de maio de 2010

A Revoluç o de 30

Direç ão: Silvio Back
Com comentários dos historiadores Bóris Fausto, Edgar Carone e Paulo Sérgio Pinheiro.

Resumo:
O documentário retrata dos momentos mais importantes da história da República no Brasil - a Revoluç o de 1930. Este foi composto por uma colagem que reúne mais de trinta documentários e filmes de ficç o, auxiliada por fotografias fixas e registros sonoros, mostrando os momentos que antecederam o conflito, seu desenrolar e consequ ncias. Seu fio condutor é o documentário 'Pátria Redimida', realizado na época por Jo o Batista Groff com cenas filmadas em algumas zonas de combate: Itararé, Ribeira e Catinguá. A passagem das tropas, sob o comando de Getúlio Vargas por Curitiba e a presença de outros chefes do movimento: Flores da Cunha, Góes Monteiro, Miguel Costa e Batista Luzardo. (...) comentários críticos dos historiadores Boris Fausto, Edgar Carone e Paulo Sérgio Pinheiro. Comp em na trilha sonora antigas gravaç es de discursos de exaltaç o aos revoltosos e músicas representativas do período, algumas compostas especialmente para celebrar a revoluç o: hinos a Jo o Pessoa, o mártir do movimento, a Miguel Costa e Juarez Távora." (Guia de Filmes)

Ficha Técnica:

CategoriasLonga-metragem / Sonoro / N o ficç ão

Material original35mm, BP, 122min, 2.755m, 24q, Agfa Gevaert

Data e local de produç oAno: 1980País: BR / Estado: PR

Produção: Companhia(s) produtora(s): Sylvio Back Produç es Cinematográficas
Companhia(s) co-produtora(s): Secretaria de Cultura e do Esporte do Paraná; Fundaç o Cultural de Curitiba

Mais informações: http://cinemateca.gov.br/cgi-bin/wxis.exe/iah/?IsisScript=iah/iah.xis&base=FILMOGRAFIA&lang=P&nextAction=search&exprSearch=ID=023843&format=detailed.pft

domingo, 30 de maio de 2010


Registro fotográfico dos protestos em São Paulo de 1917
(http://www.brasilescola.com/historiab/movimento-operario-brasileiro.htm)


Greve de 1917 - SP
(http://novahistorianet.blogspot.com/2009/01/republica-velha.html)


Panfleto comunista (da época da 1ª República, mas sem data)
(http://novahistorianet.blogspot.com/2009/01/republica-velha.html)


sábado, 22 de maio de 2010

Comentário da Resenha "As Barricadas da Saúde”

Equipe: Isabela Magalhães, Juliana Pinho, Kallyna Helena Marcolino, Luiz Felipe Batista Genú, Nathalia Bezerra Soares de Melo e Rafael de Andrade.

Comentário:

A resenha feita a partir do livro As Barricadas da Saúde, de Leonardo Pereira, foi escrita de maneira clara e muito bem estruturada. O grupo optou por expor logo no início da resenha a principal intenção da análise do autor e a base de sua argumentação para em seguida iniciar uma explanação mais detalhada dos capítulos do livro.

O grupo demonstrou boa compreensão do texto, destacando pontos de demasiada importância como a descrença de populares na medicina oficial, a hostilidade entre a população e as forças de repressão do governo, as campanhas contra a obrigatoriedade da vacina, o desempenho da oposição e de setores do exército, o papel da imprensa e as motivações dos revoltosos.

Também é trazida à discussão a forma de articulação dos trabalhadores, não no modelo sindical europeu, mas através de associações de solidariedade entre os trabalhadores, e mesmo em clubes recreativos. Outra questão abordada pelo grupo foi sobre a destruição de alvos que não tinham aparente relação com a saúde pública. Então é esclarecido que tais elementos (bondes, postes de iluminação pública e sistema de telefonia) eram utilizados pelos revoltos para formar suas barricadas, atrapalhar a comunicação entre as delegacias e dificultar a atividade da polícia. Ao final da resenha, o grupo fez o seu posicionamento crítico em relação ao livro.

Durante a apresentação, após um breve esclarecimento feito pela professora Isabel Guillen a respeito do autor do livro, o grupo teve êxito em apresentar o assunto de forma interessante, devido a abordagem utilizada. Trouxeram imagens de representações do orixá obaluaiê e foi lido pelo grupo um trecho do livro O Cortiço, de Aluísio Azevedo, também citado na resenha, que utilizaram para demonstrar as condições de moradia e a rivalidade entre populares e a polícia.

O debate historiográfico esteve presente na exposição no momento em que o grupo mencionou e comparou a visão de autores como José Murilo de Carvalho e Nicolau Sevcenko sobre a motivação da Revolta da Vacina.

Seguindo os critérios de análise estabelecidos em sala, o nosso grupo chegou à seguinte conclusão: o texto está bastante coerente e objetivo e contempla os principais pontos da argumentação do livro; apresenta o posicionamento crítico do grupo ao final e foi feito o debate historiográfico, tanto na resenha quanto na apresentação em sala. Nenhuma das normas da ABNT foi desrespeitada. Portanto decidimos atribuir ao grupo a nota 10.

Comentário da Resenha "Revolta da Vacina: mentes insanas em corpos rebeldes"

Amanda Alves
Deise Albuquerque
Jeniffer Ferreira
João Rubens Vasconcelos
Vanessa Albuquerque



Dando continuidade às atividades propostas pela disciplina, realizamos o comentário crítico da resenha elaborada pelo grupo a cerca do livro “ A Revolta da Vacina: mentes insanas em corpos rebeldes“, de Nicolau Sevcenko.

Analisando o primeiro critério avaliativo – referente à coerência e ao uso da linguagem normativa – pudemos perceber algumas falhas de pontuação quanto ao uso da vírgula. Para melhor explicitar este ponto, tomemos como ilustração uma passagem do texto em que ela foi utilizada quando não deveria ter sido empregada “ O objetivo era apresentar para grandes potências um imagem de governo sólido e estável, e assim atrair investimentos “. Notamos também alguns erros de acentuação, como “lideres “ e “ capitulo” . Contudo, não houve nenhum erro que viesse a comprometer o entendimento do texto e suscitar dúvidas a sua interpretação. (Nota 1,8).

Quanto à objetividade, o grupo expôs de forma satisfatória os argumentos do autor. Os principais pontos da obra foram ressaltados, tanto na resenha quanto na apresentação em sala de aula. O grupo seguiu seu debate de acordo com a estruturação do livro, capítulo a capítulo, o que facilitou a compreensão dos alunos presentes em sala. A interação que a equipe realizou com a professora foi também de grande valia. (Nota 2,0).

O terceiro critério – posicionamento – foi onde notamos uma maior diferença entre o que foi exposto em sala de aula e o que foi apresentado na resenha. Em sala, a equipe mostrou de forma clara o seu posicionamento, deixando evidente que para eles a revolta foi um levante legitimamente imbuído de sentido, ao contrário do que muitos estudiosos deste tema afirmam. Porém, este posicionamento não fica tão explícito no texto. Ao se valerem de uma grande quantidade de citações, (deixando claro que entendemos a relevância de citação para a elucidação de possíveis dúvidas) o grupo acabou muito por se deixar falar pelo autor e deixando de falar por si, o que fatalmente enfraquece a criticidade da resenha. Equilibrando a carência de posicionamento da resenha com o franco posicionamento tomado em sala de aula, consideramos que o terceiro critério foi alcançado pela equipe. (Nota 1,7).

Em relação ao debate com a historiografia, consideramos que a equipe foi muito bem. Levando em consideração que Sevcenko se vale bastante de fontes jornalísticas – que foram discutidas pelo grupo tanto em sala de aula quanto na resenha – e de livros de literatura – que a equipe também utilizou ao citar Aluísio de Azevedo em sua apresentação. Em sala, o grupo também fez uma comparação muito enriquecedora entre os argumentos de José Murilo de Carvalho e os de Sevcenko. (Nota 2,0)

No quinto e último critério, o grupo apresentou uma falha decorrente não da utilização incorreta das normas da ABNT, mas sim em desacordo ao que foi estipulado em relação às postagens. O grupo substituiu citação em nota de rodapé por outro sistema (autor/data), mas como realizou a citação de forma correta, achamos que também cumpriram bem este critério. (Nota 1,5).

Por fim, agradecemos à equipe pelo que foi apresentado no texto e em sala. Reconhecemos seu esforço em oferecer um trabalho de qualidade que, ao nosso ver, conseguiram fazer. Como nos foi dada a tarefa de avaliar.... Avaliamos e atribuímos nota 9,0 para a equipe.

sexta-feira, 21 de maio de 2010

"A historiografia da classe operária no Brasil" e "Formação da classe operária e projetos de identidade coletiva"

Resenha dos artigos "A historiografia da classe operária no Brasil: Trajetória e tendências" e "Formação da classe operária e projetos de identidade coletiva", ambos de autoria de Cláudio H. M. Batalha (Unicamp)

Raíssa Paz
Pedro Dantas
Luciano Ribeiro
John Keevin

Em seu artigo “A historiografia da classe operária no Brasil: Trajetórias e tendências” (BATALHA in: FREITAS, 2000) o historiador Cláudio H. M. Batalha, da Unicamp, toma como objetivo analisar a produção escrita sobre esta temática partindo de momentos anteriores a uma produção realizada por acadêmicos profissionais até a situação atual. Sua análise é muito rica e merece discussão aprofundada, propiciando inclusive um debate sobre a produção do próprio autor. Cabem antes de continuar, entretanto, algumas ressalvas, apontadas pelo próprio Batalha no começo de seu texto e que perpassam não só este material como também o outro artigo que será resenhado, intitulado “Formação da classe operária e projetos de identidade coletiva” (BATALHA in: FERREIRA; DELGADO, 2003).

Em primeiro lugar, nota-se na escrita do autor uma preocupação em não analisar as produções historiográficas isolando-as umas das outras, mas compreendendo-as dentro de contextos mais amplos. As transformações políticas, sociais e econômicas que ocorrem no Brasil e no mundo durante o século XX estão intimamente relacionadas às “tendências interpretativas” daquilo é produzida sobre determinado tema ou período. Ao mesmo tempo, Batalha não rejeita a importância das significativas mudanças de paradigma teórico-metodológicos ocorridas nas academias pelo mundo durante o mesmo período, e tampouco a influência que estas tiveram sobre os intelectuais brasileiros. É por meio deste movimento duplo de influências, presente em todo o texto, que o autor elabora sua análise.

Outra questão de extrema importância que achamos importante destacar é a distinção que o autor faz entre o que seria a história dos movimentos operários e a história da classe operária propriamente dita, estando esta confusão intimamente relacionada à apropriação que foi feita da temática por parte da esquerda brasileira (seguindo uma tendência mundial, vale ressaltar). Esta relação possui vital importância para a discussão do autor e para a compreensão do desenvolvimento da escrita sobre o assunto no Brasil, desde os seus primórdios.

É justamente por está via que surgem os primeiros trabalhos sobre a classe operária no Brasil até os anos 50, produzidos principalmente fora da academia e seguindo abertamente a lógica da guerra de opinião. Era comum no período a generalização das lutas e conquistas dos movimentos operários e do Partido Comunista como sendo aquelas de todos os trabalhadores, independente de qualquer heterogeneidade de opiniões que estes viessem a possuir. Esta tendência, que o autor chama de “militante”, possuiria principalmente uma função de legitimação, seja das políticas e opiniões do próprio partido, ou mesmo de indivíduos ligados a esquerda. Em obras como A formação do PCB (PEREIRA, 1962) já se via a idéia, recorrente no período, de que fora apenas a partir da fundação do Partido Comunista em 1922 que se poderia falar de história dos trabalhadores. Este recorte, que toma como centro de gravitação as décadas de 20 e 30, exercerá grande influência até os anos 80.

A partir dos anos 60, contudo, é que trabalhos acadêmicos propriamente ditos passam a ser produzidos lidando com a temática da classe operária. É sob a égide destas obras que, de acordo com Batalha, se cristalizam diversas noções sobre o tema, como a origem estrangeira da mão de obra e a importância desta na introdução das idéias anarquistas e socialistas entre o operariado brasileiro durante a Primeira República.

Deste período, destacam-se o trabalho de sociólogos como Juarez Brandão Lopes e Fernando Henrique Cardoso, por exemplo, que ambicionavam em seus trabalhos elaborar grandes sínteses explicativas para a situação do Brasil e do operariado brasileiro. Uma característica marcante aqui era o uso ainda tímido das fontes, principalmente no que diz respeito à diversidade destas. Esta limitação, entretanto, não impede estes pensadores de elaborar grandes teorias para explicar a situação dos trabalhadores da época em comparação àquilo que era visto em outros países.

Já nos anos 70, sob a repressão da ditadura militar, as maiores contribuições para o tema provêm dos brasilianistas (ainda que estes não focalizassem seus esforços especificamente na história do trabalho, como é o caso de Michael Hall), cuja influência se mostraria bastante duradoura. Rejeitando os grandes esquemas propostos pelos sociólogos paulistas, os pesquisadores estrangeiros buscam diversificar as fontes utilizadas e reduzir as escala de suas pesquisas, tanto temporal como espacialmente. A revisão crítica da idéia dos imigrantes como uma coletividade que desembarcava no Brasil já na condição de operariado experiente, devidamente armado ideologicamente para um novo tipo de confronto de classe, foi de fundamental importância posterior ao demonstrar que ainda restavam muitas questões abertas, aguardando apenas um olhar mais elaborado.

As críticas feitas pelos brasilianistas aos trabalhos anteriores realizados no Brasil, notadamente a falta de rigorosidade e diversidade na utilização das fontes, terá dentro da academia brasileira um efeito provocador, impulsionando novas pesquisas mais situadas na realidade acadêmica da época ao encorajar o uso de procedimentos que apesar de serem considerados “de praxe”, vinham sendo pouco seguidos pelos historiadores e sociólogos brasileiros.

Neste mesmo momento ocorre uma sensível diminuição da repressão dos militares dentro das universidades, e Batalha associa a crescente produção de dissertações sobre a temática a esta sucessão de eventos político-sociais. É nesse contexto de efervescência, no nível acadêmico sob a influência dos brasilianistas, e no nível político-social com o aumento da liberdade para a crítica contra o regime (que possibilitará a abertura do arquivo Edgar Leuenroth na Unicamp, por exemplo), que Batalha insere o trabalho de Boris Fausto (FAUSTO, 1976), assim como as dissertações de SILVA (1977), MAGNANI (1978) e FERREIRA (1978).

Observa-se então que o final dos anos 1970 havia presenciado um aumento considerável no interesse pela história do trabalho e dos trabalhadores, sendo, entretanto apenas com a chegada da década de 1980 que esta temática alcançará seu apogeu, tanto em termos de produção como de recepção do público leitor.

O contexto é de contestação do regime militar, com a greve dos metalúrgicos da ABC sugerindo a necessidade de se compreender melhor o passado da classe trabalhadora em uma tentativa de se encontrar explicações mais condizentes com a realidade vivida no período. Além deste importante momento de lenta redemocratização na história do Brasil, no mundo acadêmico a historiografia marxista inglesa produzia trabalhos de fôlego notável do ponto de vista teórico-metodológico, expandindo ainda mais as possibilidades proporcionadas pelas fontes. É deste período A formação da classe operária inglesa de Edward Thomson (THOMSON, 1987), que pode ser citado como um trabalho cuja influência ainda está por se dissipar, mais de 20 anos após sua publicação. Também em outros países a história da classe operária se expandia, abarcando novas temáticas e enfoques. No Brasil a própria cronologia sobre o tema, antes restrita ao século XX, é empurrada até 1880, propiciando novas reflexões críticas em torno de conceitos tidos quase como dogmas. Erguendo-se sobre uma nova forma de se pensar os processos históricos, o estudo da classe operária passa a se desprender progressivamente da tremenda força gravitacional exercida pela história dos movimentos e partidos operários, que dominavam até então a historiografia sobre o tema.

Ao longo dos anos 1980, então, a produção sobre o tema floresce de forma rápida. Seus frutos, entretanto, passam a cair cada vez mais longe da árvore que os originou. A fragmentação do campo de estudos produz trabalhos que se detêm em espaços cada vez menores, tanto cronologicamente como espacialmente. A própria dinâmica da academia no Brasil, com suas novas exigências metodológicas, contribuía decisivamente para esta situação. A temática da história dos trabalhadores, antes bem definida como tal, passa a se confundir com estudos sobre urbanismo, cidadania e política, por exemplo.

Buscando além do contexto da própria academia, Batalha observa ser o final dos anos 80 um momento de profunda crise da esquerda, momento onde praticamente se extingue o socialismo real como ideologia de peso no cenário geopolítico internacional. A relação dos pensadores de esquerda com os estudos sobre o operariado é evidente para o autor, como já mencionamos no começo, e a desilusão dos destes possui relação direta com a diminuição (mas não desmantelamento, ressalta Batalha) dos trabalhos sobre a temática.

Dos anos 90 até o presente essa “crise” não parece ainda ter sido superada. Até mesmo as suas raízes ainda não foram devidamente identificadas, sendo mencionada a idéia de Emilia Viotti da Costa (COSTA, 1990), para quem os motivos que levaram aos impasses atuais se devem a um embate entre duas vertentes, uma de cunho estruturalista e outra culturalista.

Em meio a esta situação, entretanto, continuam surgindo novas perspectivas para os estudos sobre a classe trabalhadora, esboçadas desde os anos 80, mas ainda não devidamente exploradas. A crescente diversificação das fontes utilizadas, por exemplo, ainda não alcançou seu potencial pleno, ao mesmo tempo em que novas leituras tanto das antigas fontes tradicionais como das mais recentes sob a luz de reflexões mais atuais à respeito do fazer historiográfico se fazem necessárias, e abrem um grande horizonte para os interessados no tema.

O outro artigo de Batalha que nos propomos a discutir neste espaço, intitulado “Formação da classe operária e projetos de identidade coletiva” (BATALHA in FERREIRA; DELGADO, 2003), se insere neste horizonte de possibilidades, apesar de possuir ambições que certamente não se refletem em outros trabalhos mais específicos do autor. A própria ausência de uma exposição de objetivos no início do artigo atesta para o seu caráter de discussão introdutória. Se “A historiografia da classe operária” (BATALHA in FREITAS, 2000) busca apresentar os caminhos percorridos pela escrita sobre esta temática ao longo da segunda metade do século XX, nesta “Formação da classe operária” Batalha expõe diversos problemas e temáticas de grande interesse para o historiador contemporâneo, preservando o caráter de debate historiográfico do primeiro artigo em boa parte do texto ao mesmo tempo em que lida diretamente com a temática em si, ainda que dentro de em um grande recorte espaço-temporal, característico de manuais de história como este “O Brasil Republicano” (FERREIRA; DELGADO, 2003) onde o artigo se insere.

Dito isso, o texto de Batalha possui grandes qualidades. O misto de revisionismo historiográfico e personalismo mostra-se eficaz para o tipo de introdução pretendida. As idéias apresentadas no longo debate descrito pelo autor no artigo que viemos de discutir são testadas diante das perspectivas do próprio Batalha, ativo ainda hoje como pesquisador da temática. Ele se sente confortável, por exemplo, em rejeitar o automatismo que associa o surto de industrialização dos anos 1880 com o surgimento da classe operária, considerando que a formação da idéia de classe se manifesta através de concepções, ações e instituições que são percebidos em longos períodos.

Um dos argumentos mais fortes utilizados pelo autor em defesa desta idéia é justamente o tamanho das mobilizações que ocorrem ao longo das duas primeiras décadas do século XX. Estes movimentos, por envolverem muito mais pessoas do que o número restrito de trabalhadores, testemunham a favor de algum tipo de experiência coletiva que surgia então. Se uma das grandes críticas feitas pela historiografia recente aos trabalhos anteriores era que estes misturavam de forma insensível a história do movimento operário com a história da classe trabalhadora como um todo, momentos como este são particularmente significativos. Afinal, sabe-se hoje que durante muito tempo os movimentos sindicais em si foram dominados por uma minoria de trabalhadores qualificados. Se, ainda assim, grandes massas de pessoas se mobilizam por identificação com as causas e reivindicações do que consideravam ser seu grupo comum, justamente a classe trabalhadora, isto é um indício da existência desta classe como uma realidade histórica que é a parteira de seus próprios significados. Isto significa rejeitar totalmente seu surgimento e organização como resultado mecânico, mero axioma do desenvolvimento da indústria e do fim da escravidão, mas sim como um processo de construção de uma identidade coletiva marcada por constantes resignificações do que significa ser parte de uma coletividade, para além dos rótulos deterministas que são impingidos posteriormente a indivíduos que durante tempo demais tiveram negado o direito à autoria de sua própria história.

Outro aspecto muito interessante da análise empreendida por Batalha é sua tentativa constante de se equilibrar entre radicalismos, talvez aquilo que Emília Viotti da Costa (COSTA, 1990) teria descrito como vertentes “estruturalistas” e “culturalistas”. Um dos momentos em que isto fica evidente é no debate sobre a influência dos imigrantes na elaboração dos movimentos operários, tanto em termos de participação efetiva como de inspiração ideológica. Enquanto uma corrente anterior, herdada dos sociólogos dos anos 60 baseados na USP, tendia a atribuir grande papel aos europeus que aqui aportavam na gênese destas organizações coletivas, convencionou-se nas décadas seguintes, dentro da historiografia, a adoção de uma postura critica diante destas afirmações, onde se procurou ressaltar a origem rural do imigrante, sua inexperiência política e suas próprias divisões internas como fatores que mais teriam dificultado que ajudado na formação dos movimentos sociais pelos trabalhadores. Batalha, por sua vez, não abraça nenhuma das explicações, afirmando antes ser importante a rejeição de qualquer análise fundada em determinações estruturais. Trata-se de uma bela provocação, que parece evocar a necessidade de esforços micro-históricos como uma forma mais capaz de compreender a complexidade das relações envolvidas entre brasileiros e os estrangeiros que aqui chegavam.

Na metade do texto, entretanto, Batalha parece abandonar progressivamente o que consideramos os aspectos mais interessantes de sua análise. Se por um lado é um grande trunfo deste momento de sua exposição mostrar as diversas divisões existentes dentro dos movimentos operários, quando diversas correntes se digladiavam pela voz mais forte dentro das associações e partidos, a proposta inicial de discutir a classe operária como algo que se manifestaria para muito além dos círculos dos movimentos vai sendo deixada de lado na medida em que o texto avança. Pouco é dito sobre o quotidiano do operariado, por exemplo, e as fontes trabalhadas são todas relacionadas a jornais e decretos dos próprios movimentos.

Não se discute a riqueza deste material, mas sim a abordagem empreendida. A recepção que os trabalhadores não-participantes dos movimentos faziam destes textos não nos parece óbvia, e deveria ser objetivo de mais investigações se a instigante idéia inicial de alcançar além daquilo que se manifestava de forma mais polêmica dentro da sociedade fosse seguida até suas últimas conseqüências.

Semelhante problema surgiria se se tentasse fazer uma história dos estudantes da UFPE com base nos jornais e decretos produzidos pelos diversos movimentos estudantis existentes dentro da universidade. A relação que se estabelece entre os estudantes e este material poderia render ricas discussões sem dúvida, mas deve-se admitir que a forma como este conteúdo é recepcionado pelos discentes está longe de ser algo dado, automático. Seguindo este raciocínio, pensamos que não foi saciado nosso interesse em compreender melhor a sociedade dos trabalhadores para além dos movimentos, pelo menos não neste trabalho específico de Batalha.

Com relação ao primeiro artigo, podemos fazer algumas reflexões que dizem respeito ao tratamento dado pelo autor as diversas correntes ou “tendências” da produção escrita sobre o tema ao longo do século XX. A maior riqueza do panorama desenhado por Batalha encontra-se justamente na sua capacidade didática, um esforço pragmático muito capaz sem dúvida, sendo de fato uma bela introdução ao tema. Por outro lado, vemos na discussão elaborada por Batalha a respeito do estudo da classe operária uma tentativa enriquecedora e muito válida de rejeitar estruturalismos e associações fáceis entre as conjunturas políticas, sociais e econômicas e os próprios trabalhadores. O estudo da participação dos imigrantes, para citar um exemplo já discutido nesta resenha, mostra como as exceções enriquecem os debates e podem lançar nova luz em explicações antes totalizantes.

Sendo assim, não fica claro para nós os motivos pelos quais essa generosidade não é estendida à própria produção historiográfica. Batalha enquadra os trabalhos escritos sobre o tema em categorias um tanto arbitrárias, e toma pouco cuidado ao associar os intelectuais e suas influências aos contextos de época em suas formas mais generalizantes, como a ditadura, as greves do fim dos anos 70, a redemocratização, a queda do comunismo, as influências acadêmicas vindas de fora, entre outros.

Da mesma forma que a redução da classe trabalhadora como um todo em movimento operário é uma ação que para nós (e para Batalha) parece pouco produtiva, a associação imediata de contextos tão gerais às idéias produzidas por indivíduos que neles se encontravam inseridos nos pareceu uma solução um tanto determinista, possivelmente necessária se levarmos em consideração o curto espaço e os amplos objetivos do texto.

Para concluir, percebemos em ambos os artigos um sabor inegável de manual, ainda mais que ambos se assemelham em suas grandes ambições espaciais e cronológicas. Entretanto, graças ao talento de Batalha e sua evidente paixão pelo tema, chega o leitor ao final da leitura com a sensação que apesar do grande caminho percorrido por esta historiografia tão particular ao longo do século XX, ainda resta muito material para ser explorado e, sobretudo, muitas vozes aguardando para serem ouvidas.

Bibliografia:

BATALHA, Cláudio. A historiografia da classe operária no Brasil: Trajetórias e tendências in FREITAS, Marcos Cezar. Historiografia brasileira em perspectiva. São Paulo : Contexto, 2000.

BATALHA, Cláudio. Formação da classe operária e projetos de identidade coletiva in FERREIRA, Jorge e DELGADO, Lucilia de Almeida Alves. O tempo do liberalismo excludente: da Proclamação da República à Revolução de 1930. Rio de Janeiro : Civilização Brasileira, 2003.

terça-feira, 18 de maio de 2010

Charges sobre a Revolta da Vacina

O povo contra a vacinação obrigatória


Fuçando a internet, encontrei algumas charges sobre a Revolta Vacina de 1904. Infelizmente, na maior parte delas, não encontrei referência às fontes das quais foram retiradas, mesmo assim, estou postando as imagens.



Vacinação



O governo e as favelas



Oswaldo contra as epidemias



Prata Preta



O cavaleiro da saúde



Papa-mosquitos



A praga do povo



Charge alusiva às medidas sanitárias empreendidas por Oswaldo Cruz



Charge publicada em Tagarela (RJ). 25/8/1904



sábado, 15 de maio de 2010

RESENHA. FAUSTO, Boris. Trabalho Urbano e Conflito Social.

RESENHA

FAUSTO, Boris. Trabalho Urbano e Conflito Social. 3. ed. São Paulo: DIFEL, 1983.


Edson de Araújo Nunes

Jônathas Cruz de Paula

Nieliton de Souza Almeida

Rafaella Valença de Andrade Galvão

Renan Vilas Boas de Melo Magalhães


Boris Fausto concluiu a graduação em direito na USP em 1962. Em 1966, graduou-se em História pela Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP. Na mesma Universidade fez o Mestrado em Metodologia da História, e o Doutorado em História. Em 1975, torna-se Livre Docente onde defendeu “Trabalho Urbano e Conflito Social na República Oligárquica”, posteriormente publicado em forma do livro objetivo desta resenha, qual seja, Trabalho Urbano e Conflito Social, lançado em 1976 pela Difusão Européia do Livro. Além esta, Boris Fausto publicou várias obras, destacando-se A Revolução de 30 – Historiografia e História[i], Crime e Quotidiano: A criminalidade em São Paulo (1880-1924)[ii], e História do Brasil[iii]. Ele é, desde 1998, colunista semanal da Folha de São Paulo.

A obra resenhada possui várias edições, o que atesta sua importância científica e temática. A estruturação é a seguinte: divide-se em três partes, subdivididas em capítulos, contando ainda com um epílogo e um apêndice. A análise aqui empreendida limitou a primeira e a segunda parte do livro.

Boris Fausto expõe na introdução a delimitação temática de seu estudo, que é a formação do movimento operário. O período temporal abordado vai de 1890 a 1920, e o recorte espacial limita-se a São Paulo e ao Rio de Janeiro. A análise é empreendida através da percepção da classe operária enquanto integrante da história global do país e da consideração da mesma como sujeito de sua história. O autor estudará esta classe social pensando nas condições materiais de existência, enfatizando neste sentido o mundo do trabalho, e a mentalidade coletiva, concebendo-a enquanto inserida na sociedade. Boris Fausto ressalta que, para além da análise de atitudes individuais, irá privilegiar, em sua obra, a compreensão das posturas e movimentos coletivos.

Na introdução da obra, o autor enceta uma consideração fundamental e que enxerta nesta obra grande importância historiográfica, posto que ele não vê a classe operária indiferente à história global do país. Desta forma, demonstra que não é possível se estudar uma classe ou sujeito histórico sem a inserção em todos os fatores que a circundam.

As influências teórico-metodológicas da temática a que o autor se debruça se baseiam, principalmente, nos trabalhos de Francisco Weffort, Azis Simão[iv], Juarez Lopes[v], Leôncio Rodrigues[vi], José Rodrigues[vii] e Sheldon Maram. Os escritos mencionados sobre movimento operário despontam a partir dos anos 60 no Brasil, a exceção de Sheldon Maram, e os autores tendiam a ordenar sínteses que abarcavam teorias explicativas do movimento e de suas opções ideológicas[viii].

Adentrando na primeira parte da obra, Boris Fausto defende a idéia de que a fase inicial da formação da classe operária no Brasil se deu a partir dos últimos anos do século XIX. Esta formação estaria interligada com a expansão da economia cafeeira, gerando um desenvolvimento do capitalismo de base agrária e que estaria impossibilitada nas décadas passadas, devido a descentralização das pequenas empresas industriais. Tal expansão da economia cafeeira relaciona-se com a crise do sistema escravista e com a crescente imigração que gerou um aumento do mercado, especialmente de mão de obra. O autor detalha parte significativa deste processo demonstrando os casos do Rio de Janeiro e de São Paulo.

O autor então demonstra que mesmo com a maior parte da população trabalhadora concentrando-se no campo, é nos centros urbanos que se forma o movimento operário, visto as possibilidades limitadas no meio rural. No entanto, as esmagadora maioria das elites oligárquicas ainda estava circunscrita ao espaço rural, principal eixo econômico do país, o que limita a esfera de atuação do operariado.

Boris Fausto traz ainda dois pontos de análise da formação da classe operária, um é relativo às condições da oferta de força de trabalho e o outro, sobre composição étnica da classe.

Em relação ao primeiro, inicialmente aponta-se a visão geral dos autores, onde esboça-se dois momentos no processo de absorção da mão-de-obra. No primeiro, a ênfase recai na concentração de força de trabalho no campo e no segundo, havendo relativa liberação desta mão-de-obra. No entanto, o autor destaca que no caso brasileiro, o primeiro momento ocorre de forma diferente nos últimos anos do século XIX, onde verifica-se um excedente de trabalhadores nas cidades. Para isto, irá analisar os casos de São Paulo e do Rio de Janeiro.

Em São Paulo, a questão liga-se ao suprimento de mão-de-obra para o setor cafeeiro, com a vinda de grande número de imigrantes, mesmo existindo uma mão-de-obra disponível. Assim, este fluxo migratório, além de uma migração dos campos para a cidade, teriam favorecido a existência de um excedente de mão-de-obra nas cidades. Já em relação ao Rio de Janeiro, demonstra-se que tal excedente se formou de maneira distinta da de São Paulo. Grande parte desta mão-de-obra é de origem da migração interna, onde destaca-se o papel atrativo da capital do país. Tal migração interna ultrapassou em volume o dos outros estados.

Num segundo momento, o autor demonstra a enorme quantidade de estrangeiros que compunham a força de trabalho em São Paulo e no Rio de Janeiro, apontando diversos dados que descrevem os estrangeiros em São Paulo tendo em diversas áreas uma porcentagem superior a 50% no período de 1890 a 1920, dando um destaque a presença majoritária no setor industrial. Já no Rio de Janeiro, os estrangeiros tinham uma porcentagem menor na população ocupada, mas também era muito expressiva. Boris Fausto afiança que os imigrantes tiveram grande influência nas ideologias reivindicatórias no país.

Uma das teses do autor é a de que, entre os estrangeiros, a identidade de classe suprimiu a identidade nacional; isto decorreria da questão da diferenciação interna do grupo e da ausência de uma xenofobia permanente por parte da oligarquia nacional, além da estabilização relativa da estrutura ocupacional vigente. Para tanto, o autor segue na contra mão de toda uma historiografia[ix] que defende que a origem étnica poderia ter limitado a afirmação de um movimento operário, pois mesmo existindo alguns atritos e mesmo com a possibilidade de um grupo se perceber como estranho ao outro, tais fatores seriam o último fundamento na concorrência da força de trabalho no mercado, onde o autor aponta até expressões de mútua solidariedade, em especial em São Paulo. Portanto, Boris Fausto não destaca a questão étnica na formação do movimento operário do período. Ele assevera que a “maior homogeneidade étnica da classe operária de São Paulo, com a presença dominante de italianos, não correspondeu um índice organizatório mais alto em comparação com o Rio de Janeiro.”[x]

Nesta primeira parte da obra, Fausto dialoga com diversos autores, com ênfase na utilização de dados, documentos ou informações convenientes para a exposição do tema, e não num debate extenso sobre a formação da classe operária. O autor não apenas cita os dados, mas também tece comentários aos mesmos, quer seja com ressalvas ou complementando-os. O diálogo de mais relevo que se estabelece aponta para autores como Wilson Cano[xi], Michel Hall[xii], Sheldon Maram[xiii].

No primeiro capítulo da segunda parte do livro, intitulado “Correntes organizatórias e seu campo de incidência”, Boris Fausto aborda a questão das influências ideológicas e dos tipos de organização do movimento operário nos estados de São Paulo e Rio de Janeiro, de 1890 a 1920. Ele identifica três correntes majoritárias que desempenharam grande influência entre os operários: o anarquismo, o socialismo e o “trabalhismo”.

Fausto define o movimento trabalhista como um movimento que buscava apenas alguns direitos operários, assim como melhores condições de vida, sem, no entanto, questionar os fundamentos da ordem social. Os trabalhistas pretendiam alcançar suas reivindicações através dos meios legais como a criação de partidos operários e através da colaboração de classes e da cooperação com o Estado.

O autor localiza a incidência mais forte do trabalhismo no Estado do Rio de Janeiro. O motivo se devia à existência, na capital federal, de setores intermediários com interesses desvinculados das oligarquias agrárias. O movimento do trabalhismo abarcou uma ampla parcela dos atores políticos: Jacobinos, Positivistas, Militares, etc. Sua influência foi mais forte no final do século XIX, e não por acaso. Boris Fausto argumenta que esse período foi um momento de indefinição do Estado. Quando, nos primeiros anos do século XX, o Estado oligárquico, ligado às classes agrárias sem compromisso com as classes urbanas, se estabelece e se define o trabalhismo entra em decadência.

Ao contrário do que ocorreu no Rio de Janeiro, em São Paulo as correntes revolucionárias tiveram maior influência no meio operário, sobretudo o anarquismo e o socialismo. Para o autor, a ausência, em São Paulo, de setores sociais desligados dos interesses das oligarquias agrárias, como oficiais do exército e funcionários do Estado, por exemplo, dificultaram a aliança dos operários com outras classes.

Os anarquistas negavam qualquer aliança classista, bem como qualquer tipo de acordo entre o capital e o trabalho. Seu objetivo era a supressão do Estado, conseqüentemente a supressão do capitalismo. Sua tática política era a ação direta, sobretudo no plano econômico e ideológico, negando os meios políticos de luta. O movimento anarquista estava dividido em correntes diversas: o “mutualismo proudhoniano”, o “anarco-coletivismo”, o “anarco-comunismo” e o “anarco-sindicalismo”.

O anarquismo, segundo Boris Fausto, teve hegemonia entre o movimento operário na América Latina até o advento da Revolução Russa. Sua penetração na América Latina se deu, sobretudo, através da imigração de intelectuais e massas de trabalhadores europeus. Tal fato explica a força do movimento anarquista em São Paulo, destino de grandes levas imigratórias de europeus, sobretudo de italianos.

No Brasil, o movimento anarquista se configurou principalmente na sua vertente anarco-sindicalista. Os meios de luta, a ação direta, se fazia por meio de greves gerais e parciais, boicotes, manifestações e sabotagem. Em alguns casos, os anarco-sindicalistas eram acusados de terrorismo, apontados como responsáveis por atentados a bomba.

Outra importante corrente é o socialismo, um pequeno círculo, com escassa penetração nos meios populares. O programa mínimo do partido socialista propunha a renovação dos artigos do código penal, principalmente o artigo que limitava a greve e a ação as associações de resistência. Uma das características do socialismo, nesse período, é sua atuação no campo da política, visando pressionar o Estado no sentido da extensão da cidadania social e política ao afirmar o objetivo de formação de partido. Antes da Revolução Russa o Partido Socialista no Brasil não tinha posição do marxismo revolucionário.

Um dos pontos realmente significativos esta na organização do anarco-sindicalismo, onde “o alvo a alcançar consistia em infundir a consciência libertaria nas massas exploradas para a destruição de um sistema dominados pelos exploradores”[xiv].

No capítulo dedicado aos trabalhadores urbanos, Boris Fausto insere dados oriundos do Censo de 1920, jornais anarquistas, além de outras fontes, bem como inclui a perspectiva de outros autores, com destaque para Maria Cecília Baeta Neves[xv] e Eric Hobsbawm[xvi] para respaldar sua argumentação. Faz análises qualitativas e quantitativas com os instrumentos citados.

Boris Fausto inicia suas análises destacando que as condições gerais do trabalho urbano no Brasil nos trinta primeiros anos do século XX são conhecidas, correspondendo nas empresas maiores, ao modelo de acumulação da primeira fase do capitalismo industrial.

O autor também atenta para a total desproteção do trabalhador no que se relaciona às condições de trabalho e aos direitos trabalhistas. Lança que a estrutura da indústria no dado recorte temporal se caracteriza pela pequena empresa, de mínima capitalização e de base técnica artesanal.

Quando faz referência à mecanização, cita a “separação” entre o trabalhador e o produto de seu trabalho, gerando pelo proletário uma falta de identificação com o resultado. Fala dos sapateiros como participantes deste processo.

Quando aborda - sem delongas - o trabalho feminino, destaca que os homens passam perceber o trabalho feminino como uma concorrência. Ao citar o trabalho infantil, avulta os maus tratos sofridos pelas crianças; principalmente os resultantes das rudes condições de trabalho.

A formação dos sindicatos e a mobilização dos trabalhadores em torno de seus direitos é assunto integrante na obra aqui resenhada. Discorre sobre os primeiros movimentos bem como analisa as aproximações e as discrepâncias de cada setor produtivo: indústria têxtil, de construção, âmbitos portuário e marítimo.

O autor ainda avulta a participação dos anarquistas nos movimentos sindicais e cita as diferenças das práticas e mentalidades entre as cidades do Rio de Janeiro e São Paulo. Em última análise, Boris afirma que a fraqueza do movimento operário reside na baixa representatividade e descontinuidade das organizações sindicais.

No capítulo A Dinâmica do Movimento Operário, Boris Fausto indica três fases para o Movimento Operário; para o autor, de 1905 a 1908, verifica-se maior êxito organizatório e maior número de mobilizações, concomitante à elaboração de leis mais repressivas. Ainda neste período, ocorre a formação da Federação Operária de São Paulo, sendo realizado também o primeiro Congresso Operário.

De 1909 a 1912 o nível organizatório sofreria queda significativa; neste aspecto, Boris Fausto procura analisar esta realidade do Movimento Operário dentro da conjuntura econômica do período, especialmente com a crise internacional de 1912, que gera fortes pressões inflacionárias no país.

Entre 1912 e 1913, haveria relativa retomada do fôlego verificado na primeira fase; no entanto, ainda analisando a conjuntura econômica, o autor destaca o agravamento da recessão já mencionada ante o início do primeiro grande conflito bélico de proporções globais na história: a Primeira Guerra Mundial.

Boris Fausto elenca três grandes greves que ocorrem em São Paulo: o Movimento da Companhia Paulista; a greve pelas oito horas de trabalho; e a mobilização de 1912. Aqui, Boris Fausto se utiliza de diversas fontes do período, com destaque para os jornais A Voz do Trabalhador, A Terra Livre, Fanfulla, A Platéia e O Comércio de São Paulo, trazendo a tona falas, tons e discursos destes movimentos.

Num diálogo com Eric Hobsbawm[xvii], Boris Fausto concorda que, com o predomínio industrial na economia, coincide uma relação positiva entre os períodos de prosperidade e conseqüente aumento da mobilização operária; todavia,um das ressalvas lapidares do autor é que o aparente incentivo às atividades e mobilizações do operariado urbano não correspondem a um aumento do poder de barganha das lideranças sindicais nas greves, o que é atestado pelos resultados negativos das paralisações.

Um das questões que Boris Fausto busca elucidar é acerca das condições para o desenvolvimento do Movimento Operário em São Paulo; aqui, o autor destaca a situação de São Paulo enquanto centro urbano industrial; a chegada de quadros anarquistas e socialistas em princípio do século; e, por fim, a constituição de um proletariado relativamente homogêneo.

Notadamente, no que tange à historiografia, o uso de terminologias como ideologia, proletariado, divisão do trabalho, força de trabalho, entre outras, bem como da bibliografia arrolada em notas e no fim da obra, percebemos que esta se insere numa vertente marxista. Tal vertente tende a polarizar a classe dominante de uma lado e a classe operária do outro, o que é verificado em Trabalho Urbano e Conflito Social. O autor também aponta as similitudes sociais acima da origem étnica na formação desta classe. Nas duas partes da obra analisada e seus respectivos capítulos, para compreensão da formação do Movimento Operário, Boris Fausto enfatiza os âmbitos das esferas econômica e social, sem tecer análises acerca das questões culturais presentes neste processo.

Um ponto de destaque da obra é a utilização de tabelas criticamente, ou seja, o autor se apodera de tabelas de outros livros ou de censos fazendo ressalvas e demonstrando as falhas que elas possuem. Assim, Boris Fausto emprega a prática da Cliometria, ou seja, a aplicação de métodos quantitativos na ciência de Clio.

Esta obra de Boris Fausto insere-se em uma série de trabalhos, supramencionados, acerca da classe operária no Brasil, no entanto, ele inova trazendo novas idéias acerca da formação desta classe, que divergem de análises anteriores. Vale ressaltar ainda o diálogo com brasilianistas[xviii], que dedicaram importantes estudos históricos relacionados a esta classe.



[i] FAUSTO, Boris. A Revolução de 1930 - historiografia e história. 4. ed. São Paulo: Brasiliense, 1976.

[ii] Id. Crime e cotidiano: a criminalidade em São Paulo (1880-1924). São Paulo: Brasiliense, 1984.

[iii] Id. História do Brasil. 5. ed. São Paulo: EDUSP; Fundação para o desenvolvimento da educação, 1997.

Boris Fausto aponta Weffort como tendo grande influência em sua metodologia. FRANCISCO, Weffort. Sindicato e Política. 1973 (mimeo.)

[iv] . Simão se destaca entre os demais por apontar sua análise como limitada a São Paulo, e não generalizar a todo Brasil, como era a tendência. SIMÃO, Azis. Sindicato e Estado: suas relações na formação do proletariado. São Paulo: Dominus; USP, 1966 Apud BATALHA, Cláudio H. M. "A Historiografia da Classe Operária no Brasil: Trajetória e Tendências". In: FREITAS, Marcos Cezar. Historiografia Brasileira em perspectiva. 6. ed. São Paulo: Contexto, 2005.

[v] Lopes é tido como que iniciou as análises sociológicas do movimento operário. Ele irá estabelecer critérios de análises para a classe operária,a exemplo a origem rural. LOPES, Juarez Brandão. Sociedade Industrial no Brasil. São Paulo: DIFEL, 1964. Apud BATALHA, Cláudio H. M. "A Historiografia da Classe Operária no Brasil: Trajetória e Tendências". In: FREITAS, Marcos Cezar. Historiografia Brasileira em perspectiva... op. cit

[vi] Rodrigues distingue duas fases na história do movimento operário, a pré e a pós 1930. O ponto divisor residiria na mudança da composição sociológica da classe operária. RODRIGUES, Leôncio Martins. Conflito Industrial e Sindicalismo no Brasil. São Paulo: DIFEL, 1966. Apud BATALHA, Cláudio H. M. "A Historiografia da Classe Operária no Brasil: Trajetória e Tendências". In: FREITAS, Marcos Cezar. Historiografia Brasileira em perspectiva... op. cit.

[vii] José Rodrigues é tido como pioneiro na critica de 1930 como marco na história do movimento operário, para tanto ele estabelece uma nova divisão em cinco fases. RODRIGUES, José Albertino. Sindicato e Desenvolvimento no Brasil. São Paulo: DIFEL, 1968. Apud BATALHA, Cláudio H. M. "A Historiografia da Classe Operária no Brasil: Trajetória e Tendências". In: FREITAS, Marcos Cezar. Historiografia Brasileira em perspectiva... op. cit.

[viii] FREITAS, Marcos Cezar. Historiografia Brasileira em perspectiva... op. cit.

[ix] A exemplo de Sheldon Maram que, divergindo de Fausto, vê a origem étnica como fator importante na limitação da formação do movimento operário. Ver MARAM, Sheldon. Anarquistas, imigrantes e movimento operário brasileiro (l890-l920). Rio de Janeiro: Paz e Terra, l979 Apud BATALHA, Cláudio H. M. "A Historiografia da Classe Operária no Brasil: Trajetória e Tendências". In: FREITAS, Marcos Cezar. Historiografia Brasileira em perspectiva... op. cit. ; ver também FAUSTO, Boris. Trabalho Urbano e Conflito Social. 3. ed. São Paulo: DIFEL, 1983. p. 37

[x] FAUSTO, Boris. Trabalho Urbano e Conflito Social... op. cit.

[xi] CANO, Wilson. Raízes da concentração industrial em São Paulo. São Paulo: DIFEL, 1975. Cano tornou mais conhecida a idéia do desenvolvimento de um núcleo industrial partindo da expansão cafeeira e pondera sobre a contribuição dos imigrantes neste processo.

[xii] HALL, Michel M. The Origins of Mass Immigration in Brazil, 1871-1914. (Mimeo.). Hall traz uma inovação na visão da origem dos imigrantes, onde ele aponta a derivação do âmbito rural sem maiores experiências na indústria. Ver BATALHA, Cláudio H. M. "A Historiografia da Classe Operária no Brasil: Trajetória e Tendências". In: FREITAS, Marcos Cezar. Historiografia Brasileira em perspectiva... op. cit.

[xiii] Maram é responsável por desenvolver uma das primeiras análises acerca do movimento no período que Boris Fausto estuda, 1890-1920. ver MARAM, Sheldon Leslie. Anarquistas, imigrantes... Op. Cit.

[xiv] FAUSTO, Boris. Trabalho Urbano ... Op. Cit. p. 104.

[xv] NEVES, Maria Cecília Baeta. “Greve dos sapateiros de 1906 no Rio de Janeiro: notas de pesquisa”. In: Revista de Administração de Empresas. S. l., n. 13, Abr./jun., 1973.

[xvi] HOBSBAWM, Eric. “Custom, Wages, and Work-Load in Industry”. In: BRIGGS, Asa; SAVILLE, John (ed.). Essays in Labour History. Londres: s. e., 1967.

[xvii] Id. “Economic Flutuations and some Social Movements since 1800”. In: Labouring Men (Studies in the History of Labour). Londres: s. e., 1964.

[xviii] A exemplo de MARAM, Sheldon Leslie. Anarquistas, imigrantes... Op. Cit.; HALL, Michel M. The Origins of Mass … Op. Cit.